domingo, 17 de outubro de 2010

Quando o sonho não quer ser sonho

É tão dificil desistir das pessoas que nos tocaram. Mesmo quando a mente decide, o subconsciente prega-nos vis partidas e trá-no-las de volta como se nunca nos tivessem magoado. Quando em sonhos nos visitam, tudo parece ser possível, o imperdoável passa a ser quase miragem, coisa vaga e já esquecida. E nada mais importa a não ser aquela espécie de regresso ao futuro que só no reino de Morfeu acontece. Depois, enquanto o emergir no aqui e agora se torna inevitável, qual espiral ascendente, a incongruência surge a pouco e pouco como evidente, a realidade desaba como um raio, cruel, implacável. E percebemos que a dor permanece, como se tivesse sido ontem. O peito aperta-se e tudo volta, em catatupa. É tão dificil desistir das pessoas que nos tocaram. Quiséramos que nunca nos tivessem magoado. Quiséramos que tudo fosse como no sonho. Como antes do sonho. Porque mesmo o sonho parece esquecer que é sonho. E atirar-nos bruscamente para o mundo real. Como se nem ele próprio quisesse persistir na ilusão. Como se ele próprio quisesse tornar-se outra coisa que não sonho. Mas ao mesmo tempo tão real que nos persegue dias a fio como se sonho não fosse.

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

104.3, a frequência

É de noite, tarde cheguei a casa, estacionei o carro, não saí. É outono. Chove lá fora. A rádio é a CMR. 104.3, a frequência. Tu no teu quarto, eu no meu. Unidos pelo éter, ouvindo as nossas músicas. Sentada ao volante do carro, estou de volta ao meu quarto. Eu no meu quarto que me ajudaste a conquistar, no meu espaço, tão teu. Tu no teu quarto, ou na sala, já não sei. Eu entrando sorrateira no quarto dos meus pais, trazendo o telefone. Era de noite, tarde, muito tarde. O rádio ligado. 104.3, a frequência. O telefone ligado à ficha do corredor, o fio esticado até à cabeceira da cama. Ligados pelo 104.3. Just Like Heaven, o telefone toca. Nem chega a tocar. Estás aí? Estou pois. Chove lá fora. Ao volante do meu carro, nem me mexo, para não deixar quebrar o encanto. Estás aí? Deves estar. É outono. Chove lá fora. A rádio é a M80. 104.3 a frequência. Eu no meu carro, tu numa estrela. Numa nuvem talvez? Unidos pela eternidade, ouvindo as nossas músicas. Vou para casa. Tenho o telefone, o telemóvel, o computador. Tenho o quarto e a sala. Chove lá fora. Chove... tanto! E conforme a escrevo a chuva amaina, amansa para dar passagem ao avião. Escolheu este momento preciso para se manifestar. Sorrio-te. O último avião da noite. Ou talvez o primeiro da manhã. Uncertain Smile. É tão tarde.... E eis que chove a bom chover. O telefone não vai tocar esta noite. Vou ligar a M80. A chuva parou. It's all in the game. Estás aí? Estou pois.